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Mensagens

A mostrar mensagens de dezembro, 2012

O PRIMEIRO DE JANEIRO

  PRIMEIRO DE JANEIRO     O primeiro de janeiro é, definitivamente, o dia mais deprimente do ano; o primeiro de janeiro devia deixar de ser o número um, a casa de partida, o ponto de largada para novos trezentos e sessenta e cinco dias de velhos hábitos e padrões parasitados nas mentes humanas. Designe-se e registe-se em agenda– com todos os trâmites oficiais- o reveillon para o primeiro de janeiro: comece-se a pompa (sim, não se aniquile a tradição) no último de dezembro, e prolongue-se a circunstância por mais vinte e quatro horas. E depois sim: o segundo de janeiro para desintoxicar o corpo, reinventar o espirito e reanimar a alma. Era mais honesto, mais saudável, e provocava menos azia ao ter de ir trabalhar ou ir para a escola nas primeiras horas, do segundo dia, do novo ano. Caramba, lembro-me bem como era penoso regressar às aulas depois das férias do Natal, e começar a classe de Português com: as Janeiras.   Acontece que uma noite dos diabos termina o...

O REGRESSO

                                      O REGRESSO     Um homem com uma arma apontada à sua própria cabeça. Mão firme. Olhos fechados. Tranquilo não está – nunca poderia haver tranquilidade num momento de morte auto assistida. Tudo tão estranho, tudo tão hostil, tudo tão sem sentido: ódio pelo mundo, repugnância pela própria existência! Porquê continuar a carregar um fardo de infelicidade? Porquê prolongar, em assaltos infinitos, uma luta ... desigual com a sociedade? Ansiedade. Profundo anseio pela aniquilação. Este homem não queria – não podia- continuar a viver com ele mesmo. Ele mesmo: desprezível, falhado, azarado, peregrino no caminho do desamor, intoxicante como um gás repelente espalhado pelo mundo. Um suspiro, um último suspiro. Bang! Nada. Escuridão. Medo…muito medo! O homem (que...

OBRIGADO, DESIGUALMENTE!

                                       OBRIGADO, DESIGUALMENTE!     E viva as festas. E os jantares de empresa. E os abraços. E os braços dados. E os beijos feitos. E gritem-se os Felizes Natais, e outros desejos que tais. E proclame-se, como diz o povo, um próspero Ano Novo. E ouçam-se, de orelhas arrebitadas, os “obrigado, igualmente”, daqueles que são ditos – e escritos- a seco, em menos de cinco segundos, só porque tem de ser, só porque é de boa eduação responder qualquer coisa quando alguém te deseja…alguma coisa simpática. “Obrigado, igualmente” é o lema dos despachantes, dos “despacha lá isso, que já estou cheio de te ouvir”; reparem nas diferenças de velocidade que distanciam um “Feliz Natal” de um “obrigado, igualmente!”. Então: de um “Feliz Natal” ao “muito obrigado. Fe...

ENCONTRO DE SARAMAGO COM DEUS

ENCONTRO DE SARAMAGO COM DEUS -Que luz é esta que não me ofusca? Que voz é esta que não ouço, mas escuto nas profundezas da alma? E esta leveza que liberta o meu corpo; o corpo que já não vejo, o corpo que já não sinto. Deus! És Deus! Tu é que és Deus? -Vocês e os nomes. O vício humano de etiquetar tudo. -Mas és Deus, certo? -E tu és José, certo? -Sou. Prazer! Deus? -Aquele que É. Simplesmente aquele que É! -Pronto, sejas o que for ! Então qual é o meu castigo? -Castigo? -Sim, castigo! Sempre ouvi dizer que quem te ofendesse arriscava-se a uma punição eterna, atravancado no lodo infernal. -Estranhas palavras para um ateu! - Ateu. Não sou um –ou não era- um ateu total: todos os dias tentei encontrar um sinal de TI, mas infelizmente não TE encontrei. -Indícios; toda a vida terrena é feita de acontecimentos que indiciam que há – mais, muito mais- vida para além da vida. -Sim, sim. E eu sempre escrevi: “a vida é breve, mas cabe nela muito mais do que ...

PALAVRAS LEVADAS DA BRECA

PALAVRAS LEVADAS DA BRECA  Há pessoas que nasceram com o rabo virado para lua, diz o povo na sua sapiência infinitiva, tentando etiquetar aquelas pessoas que têm sorte em tudo e mais alguma coisa. Será mesmo assim? Será mesmo uma boa de uma sorte para alguém, logo à nascença, já estar de rabo feito, a oferecer-se para o que der e vier? E, se calhar, alguns destes sortudos, já crescidinhos, para além de darem o rabo, ainda põem dois tostões no pacote (lá está) de oferta para potencializarem os desígnios da fortuna; gostam de dar o rabo à seringa, mas quando a coisa lhes corre mal fogem com (imagino, a sensação de desconforto) o rabinho entre as pernas. Mas talvez a sorte de chegar a este triste mundo com o rabo virado para lua seja apenas porque alguém se livra, desde logo, de começar a levar umas nalgadas dos brutamontes dos médicos mal ponha o rabiosque de fora.   Depois, há quem nasça com o pau torto; um pau, testifica o dito popular, que jamais de endireitará; o dit...

EM BRANCO

                             EM BRANCO Espaço em branco. Espaço totalmente em branco. Pânico? Nada disso. O espaço em branco é das mais belas coisas criadas pelo Universo; porque é aqui, no espaço em branco, que podes criar as   coisas mais belas que ainda não foram criadas no Universo. Podes moldar, como quiseres e bem te apetecer, a silhueta das palavras; dar-lhes pesos, engordar-lhes o sentido, aumentar-lhes o jogo de cintura, alimentá-las com consistência. É o espaço onde nada acontece –mas tudo pode acontecer, a qualquer instante, num momentâneo lapso de razão, em que a alma e a inspiração tomam conta das ocorrências. No espaço em branco és o criador - o que dá a solução antes mesmo de surgir o problema- o grande arquitecto, o divino, o Deus que já és, e o diabo a quatro. Constróis o mundo,o novo mundo feito à tua imagem e semelhanç...

O FIM DO MUNDO

O FIM DO MUNDO   12 horas,12 minutos, do dia 12 do 12 de 2012: e o mundo não acabou! O mundo ainda não acabou. Este mundo, que está para acabar, continua assim: embrulhado em crises; embrenhado em ilusões; desfigurado em alucinações; sufocado no tempo; estropiado na sensatez e na honestidade. Um mundozinho a arrotar ganância, a regurgitar inveja, a bolçar julgamentos sumários sobre o próximo, a golfar estupidez, a cuspir miséria, enfezado em mesquinhez e a obrar poder (zinhos). O mundo é o refluxo (sim, também: o reflexo) da inconsciência humana. Desejei (sim, qual é o problema, meretíssimos juizes?) que o mundo acabasse mesmo às 12 horas, 12 minutos, do dia 12 do 12 de 2012: e em ponto! Right on time. À la minute. In tempo. Mas não imaginei o grand finale com explosões hollywoodescas; e terramotos; e tsunamis; e degelos; e Deus a carregar em “terminar sessão” e desligar o computador terrestre. Nada disso. A grande cena seria: EXT. MUNDO – DIA: multidões de pessoas em passo ac...

ELA

«É ela. É sempre ela. Para onde quer que olhe, para onde quer que vá. É ela. É sempre ela. O rosto dela, os traços dela, o jeito dela. E ouço-a falar. E sei exactamente como ela fala, e conheço exactamente o tom de voz dela, cada pausa, cada esgar, cada momento em que pára para pensar e cada momento em que pára para sorrir. E sou eu que paro. Sou eu que, ao vê-la em cada espaço por preencher dentro dos meus olhos (e o que são os olhos senão espaços por preencher; espaços sempre por preencher?), não paro. Continuo a encontrá-la. E não sei o que hei-de fazer para lhe fugir (como se foge do que está por dentro dos olhos? como se escapa do que não pode ser eliminado, do que não é mais do que um pensamento dentro da cabeça? como se escapa do que não existe? como se acaba com o que nunca começou?), não sei o que hei-de fazer para me fugir.» Pedro Chagas Freitas, in "OU É TUDO OU NÃO VALE NADA

ÊXTASE

ÊXTASE   E então foi assim...o amor aconteceu num dia de inverno como o de hoje. Surgiste por detrás da chuva, como um céu limpo, puramente radioso e brilhante, transbordando a felicidade que nós, comuns mortais, ambicionamos alcançar um dia. Sim, nós – eu - ao pé de ti somos comuns mortais, extasiados e rendidos a esse corpo criado no mundo da imensidão; o mundo das limitações não pode, não sabe (mas quer) conceber uma beleza destas: A BELEZA. Mesmo assim: escrita em caixa alta, a melhor forma para reproduzir a tua grandeza, o teu ser, BELO, que escapou por entre um pedaço de tempo para alcançar o infinito. Afinal a transcendência é isto: é isto que os astronautas sentem, petrificados com a visão da Terra, uma pérola azul suspensa na escuridão do Universo; foi a isto que Edmund Hillary assistiu quando escalou, pela primeira vez, o Everest.   Conheci a alegria, o prazer, a exuberância, a satisfação, estados e sentimentos de felicidade. Mas nunca o êxtase, este êxtase...

DO QUE ESTÁS À ESPERA?

DO QUE ESTÁS À ESPERA?   Dizer que quem espera sempre alcança é uma das mais profundas mentiras populares ou, pelo menos, uma meia verdade profundamente mal explicada. Porque o adágio não explica o que é que realmente se alcança, apenas nos sugere que fiquemos “para aí à espera” e depois “logo se vê, olha!”. A (in) verdade disto é que as horas desta vida são corridas a esperar: esperas aí, esperas um bocadinho, esperas bem, só esperas, esperavas mais, esperavas menos, esperas no mínimo, ficas à espera, esperas para ver, e, pontualmente, até aplicas uma exceção a estas esperas: “não esperes por mim para jantar!”.   Desafio-te a elaborares uma lista de quantas coisas alcançaste por estares à espera! Esperaste por um amor que sempre desejaste e –all you need is love- o amor aconteceu? Esperaste que te saísse o Euromilhões e – magia -estás rico? Esperaste que a oportunidade de mudares para um emprego melhor te aparecesse e- tcharan- apareceu mesmo? Esperaste por um elogio ...

NA ESCURIDÃO

NA ESCURIDÃO  Deita-te na escuridão, sozinho com ela, e sozinho nela; fecha os olhos, respira, tranquilamente, suavemente, dois tempos para inspirar, quatro tempos para expirar, respira no silêncio, respira o silêncio e não esperes nada, não queiras nada, não penses nada, apenas fica, apenas sê. Agora abre, lentamente, os olhos, e fixa a escuridão, galanteia-a, olha-a sem pestanejar, sorri para ela, diz-lhe que é linda, e sem deixares de sorrir começa a beijá-la, abraça-a, cheira-a, sente-a, e depois penetra-a como se a desejasses desde sempre, como uma mulher fatal inalcançável, impossível de possuir. Há momentos em que parece que ela te foge, esconde-se como uma menininha envergonhada; são os momentos em que, inconscientemente, tens um piscar de olhos, uma nano fração de segundo que te deixa perdido, como este espaço lúgrube sem tempo: vazio. Precisas dela e vais procurá-la; não, não feches mais os olhos, porque quando os fechas entras no teu próprio umbral, na penumbra qu...