Dois anos depois,
ele descobre que, afinal, a vida nunca foi vida; ou que a vida sempre foi: não
vida. Dois anos (vazios, efémeros) a ser conduzido por outros, pelas vontades
alheias, ostracizado nas opiniões, a alertar para os obstáculos –mas não a
desviá-los; proativo, e nunca ativo: diz, fala, explica, planeia, mas sem tomar
o controlo dos acontecimentos: como um co-piloto. Assim mesmo: CO-PILOTO.
Hifenizado, desaglutinado, desacordado ortograficamente. E, por isso, aqui e
agora, neste momento, o co-piloto jamais será ostracizado; nunca, perderá a sua
identidade, o estatuto que adquiriu ao longo dos tempos. Valha-lhe isso: o
poder da palavra. Aqui e agora, o co-piloto
será escrito à moda antiga-como nasceu, e como ficou universalmente
conhecido.
Chega. Chega do
co-piloto ser sempre desvalorizado; chega do co-piloto ser o individuo a quem
ser agradece –também. Porquê? Por que razão não é o primeiro na lista de
agradecimentos? Caramba, este homem (ou mulher) é tudo para o sucesso do
piloto, e torna-se nada na hora das vitórias: o nome aparece escrito por baixo,
em letras menores, em segundo plano; é o proscrito- sempre foi. Na faculdade,
era o que escrevia os resumos para as frequências; era frequência habitual na
reprografia, para depois distribuir as fotocópias pelos colegas. É com o
adjunto, no futebol. É o tipo que sabe, estuda, conhece, analisa os
adversários, aconselha, ouve os jogadores, ajuda-os, potencia-lhes faculdades e
capacidade, faz o trabalho de sapa, e no fim: é da equipa do treinador tal que
se fala, e se coloca nas primeiras páginas dos jornais, nos leads dos noticiários
televisivos-e radiofónicos. É o mister: o principal. Nos aviões: a mesma coisa
(fala-vos o comandante Avelino Sequeira); ralis: pior ainda: co-piloto nem olha
para a estrada.
É verdade, sim
senhor: um ator secundário tem direito a prémio. Pois tem: mas é sempre
oscarizado – ou globalizado- por um papel de suporte. O papel que suporta (lá
está), e em que trabalha sempre por, e para conta de outrem. Mas no teatro?
Para quem são os aplausos pé? O ator principal, o centro das atenções. Veêm?
Para o lado das atenções: zero, zerinho, népia. O co-piloto nunca vive a
adrenalina-apesar de ver na escuridão. E de respirar no imprevisível. E de
confiar no invisível. É o mapa de estradas falante; é o primeiro GPS da
história da humanidade: programado para saber (e conhecer) que todos os
caminhos vão dar à glória do piloto- ou não.
Os co-pilotos deviam ter um
hino, criar uma sede própria- a ANCOP (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE CO-PILOTOS). Uma espécie de sindicato que pusesse fim aos regimes de colaboração desproporcionada. Cooperar sim- mas com critério. Ajudar, com certeza- mas com sentido de justiça e equidade; ser CO, tudo bem- mas que no fim de tudo, seja rosto nos triunfos. Tudo: isto e muito mais para os únicos seres humanos a cumprirem, à risca, a máxima de Sócrates (o genuíno):“mais vale sofrer uma injustiça do que cometê-la".
RUI MIGUEL MENDONÇA
excelente!
ResponderEliminarvamos já criar essa associação